domingo, 29 de julho de 2012

Tira-gosto de Domingo

Mãe chegou da ilha!
Ô saudade da velha
E veio trazendo num isopor
Com uma tipóia
Um camarão fresquim de Tutóia

Pai trouxe um limão da Trizidela do Vale
Daqueles amarelos e pequenos
Que não se encontram cá por esses terrenos
Fazendo inveja ao cerrado de vermelha pele
Pois em terra de rolinha e de assum
São chamados de limão comum

E o limão do véi se juntou com o camarão da véa
E a coisa ficou feia:
Chorar com saudade da Trizidela não é novidade
É minha mazela
Mas chorar com saudade de Tutóia?
Terra que eu não conheço o cheiro
Nem sei a cor da praia!
A coisa ficou feia...

Mas o negócio desandou mesmo, lhe falo,
Quando papai botou um fio de azeite Galo
Pra diminuir o gosto de sal
E no meio do samba de domingo
Eu derramei duas lágrimas
Com saudade de Portugal!

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Dos Vícios

Café preto, chocolate amargo, abraço de mãe
Pinga, pingado, pisante girado na roda
Viver o carnaval das Pedreiras
Santo Antônio dos Oliveiras
Marenice chorando e dizendo meu filho, tu volta!

O gunga roncando, o viola chorando e o médio ditando a cadência
O crivador é afinado no fogo
O meião é tocado no soco
E o roncador é quem manda na punga

Chuva, trova, uva, vulva, luva de lutador
Figo, farinha, família, fogo no rabo e no amor

Dostoiévski, Tchaikovsky, queijo e charque, Maiakovski
Paul McCartney, Hobsbawn, Led Zeppelin, Harry Potter
Paroles com Delon, Victor Hugo, Piaf, cabernet sauvignon

Mas de tantos vícios,
Morena danada sem eira na beira da cama,
Teu cheiro é o que me faz contar os dias
Como qualquer viciado faria
Quando o tempo passa distante do vício que ama

sexta-feira, 20 de julho de 2012

Anormal


Hoje o dia tá estranho, alguma coisa aconteceu
Meu mestre faltou à roda
Meu mestre nunca falta à roda!
Toquei uma iuna belamente
Mas todos me olhavam de forma estranha
Peguei o carro, o pneu dianteiro esquerdo estava vazio
Enchi-o
Como assim alguém lê minha poesias e pensa em mim diariamente?
Totalmente estranho
O pneu dianteiro esquerdo estava novamente vazio
Tinha um encontro marcado
Mas ela estava com sono
ELA?
Quem sente sono sou eu!
Ia dirigindo pelo boulevard, a direção tendendo à esquerda
No cachorro quente os adolescentes estavam sem camisa e de braços cruzados
Todos olhando para a quadra
Atravessando a pista às quedas outros adolescentes com garrafas e cigarros nas mãos
Cheguei ao prédio e quase não consigo entrar
Quanta gente parada na porta sussurrando!
Da varanda agora vejo as luzes vermelhas e intermitentes da polícia na quadra
Será que mais um pulou na linha do metrô?
Será que outro amante convidou a amada a conhecer seu apartamento do vigésimo andar por fora da janela?
Luzes de polícia fazem até dias normais serem estranhos
Imagina hoje então...
Vejo comentários feitos por um amigo de farra no PC totalmente anormais
Como posso estar possuído pelo desejo de lhe dar um tapa na cara?
Caro João, nesse dia especialmente estranho quero quebrar tua cara, filho da puta!
Nem o pinho parece me aceitar direito
Dias estranhos:
Será que são reais,
Ou apenas visíveis a olhos estranhamente parciais?

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Meus Sinais


No amor, vê se interpreta,
Te chamo “preta” só de começo
“Minha linda”, se tu me atiça
Se “minha querida”, não te mereço
Mas te prepara para a verdade
O meu “morena” é malandro
É com malícia, é com maldade
Maquiavélico, sem maquiagem
É paixão, é ardência
É indecência, é fuleragem

Se te mando um “beijo”,
As coisas não vão bem
Um “beijão” é do dia a dia
Um “abraço” o é também
Mas um “cheiro” é orgia
É maldoso, não é são
Tem, no mínimo,
Quarta intenção
É indiscreto, é sem vergonha
É sacana, é pilantra
É filosofia tantra
É uma carta pra cegonha

Então te atenta se te interessa
Que eu nos sinais não disfarço.
Às vezes, finjo que faço, mas não faço,
Entendo fingindo embaraço,
Finjo que vejo, mas não vejo,
Mostro agrado tendo nojo.
Mas na linguagem eu me entrego
Com o olho eu minto, com a língua eu pago.
Então, se um dia tu me ouvir dizer, nada ameno
“Um cheiro bem no meio desse cangote moreno,
Morena”, perceba logo o perigo
Ou um dos dois vai sair ferido,
Ou no amor faremos doutorado

Nada Acadêmico


Eu não uso pena pra escrever
Uso uma caneta bic, ou o Word
Ou, se Jah quiser, o iPad que minha tia vai trazer do estrangeiro

Eu não suspiro à toa
Não gosto de acertar a métrica dos versos com “Ah!”, “Oh!”, “Ai...”
A não ser que seja um
“Ah! Vai te lascar, não aguento mais reclamação”
“Oh! Será que aquilo é uma cobra? Oh! Oh! Oh, porra, bem ali!”
“Ai... meu dedo ainda tá doendo da topada que eu levei na envergadura da parede”

Não conheço donzelas, princesas, damas
Desculpa, não conheço
Mas se me pergunta da guria, da morena, da mulher, da minha linda, da galega
Escrevo muito pra elas!

Se um olho brilha, não precisa ser como a estrela
O sorriso não precisa ser claro como o céu
Nem o coração grande como o mar
Oxi, o olho brilha, o sorriso é claro e o coração grande tal qual eles mesmos

Por último, não tomo absinto nem sinto meu peito tísico
Quando doente, tenho gripe, sinusite, dor de cabeça, uma simples ressaca ou uma hemorragia hepática
Gosto muito de cachaça, Skol, Bhrama, Antártica (a original então...), catuaba, tequila, montila, vinho, ainda ontem arrochei um combo de Orloff com red Bull que quebrou minha fatura,
Por isso hoje escrevo sob o efeito de uma singela Bavária e de uma tosse do cão
Esses versos insatisfeitos com a poesia ornamentada e falsa da minha geração

domingo, 8 de julho de 2012

Egocêntrico por Ignorância


“Pinto a mim mesma porque sou sozinha e porque sou o assunto que conheço melhor.”
Frida Kahlo


Queria fazer uma poesia que tocasse todos os corações
Feito fossem um
Cada um se sentindo um nico
Queria escrever uma história única e que fizesse total sentido
Feito fosse verdade
Todos a tocassem como quem vê rdade
Queria eliminar de todas as minhas linhas a metalinguagem
Que se faça a poesia
Não se explique a feitoria!
Queria escrever um livro em nada parecido comigo
Não desisto da minha ode sobre a preguiça
Não abandono minha canção sobre as revoluções
Não desisto, não abandono e nem as faço
Pois só sei falar de mim de mim de mim de mim de mim de mim
E a história da capoeira, do forró, do cavaco, da Casa das Minas, do queberentã de zomadonu
Queria contar tantas histórias
Mas o medo do erro recorre e me pede que se faça jus aos especialistas
Estes nunca tem o coração tocado por canções que tocam todos
Então falo de mim de mim de mim de mim
Eu, me, meu, ma, mo, mim, comigo
Eis o mote de meus escritos

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Nonato


Piauí, menino besta.
Nasceu no Piauí
Mas não nasceu Piauí
Nasceu Raimundo Nonato
E, de fato, cresceu em Upaon-Açu
Mas foi morar em Goiânia
Devido ao emprego do pai
No Itaú

Raimundim, abestado
Foi virar Piauí numa cadeia do Rio de Janeiro
E pro Três Rios, pro Angra, pro da-Rocinha
Era chamado estrangeiro
“Tu, de outro país, vem pro Vermelho!”
Dizia o do Comando
“Vem pro Terceiro”
Diziam noutro bando
Mas foi bater no subsolo,
Que, de um falo,
Não seria nem a base das bolas

Piauí, por besteira.
“Piauí!”, “Foi visto!”, na refeição matinal
“Piauí”, era o que dizia
Sua cueca no varal
“Mas esse tal de Piauí
Fica em que região de São Paulo?”
Perguntou, um dia,
O de São Gonçalo

Raimundo Nonato, que bosta
foi lembrar seu nome
No dia em que o Juiz negou o alvará
Passou a dor na costa
Passou a fome
São não passou aquele cheiro de merda no ar

Piauí... agora basta!
Se entregou àquela condição
Agora é líder de cela
E espera a liberdade provisória
Pra sair no natal
E mandar ao juiz uma carta precatória
Alterando sua residência
Da Barra da Tijuca para o inferno, 
Sem mais história

Indigente, vai ser festa!
Vai subir Minas, Goiás, Tocantins,
Passar no Maranhão, Pará, Parintins,
Voltar pro Pará, Amapá e, por fim,
A Guiana Francesa!
Onde aplicará seu francês
E a indigência terá mais beleza
Até em casual encontro com a Federal...
Dizem que lá tem Todinho na sobremesa!

Indigent, c'est pas qu’un rêve,
Enchanté! C’est un plaisir d'être ici!
Mais j’attends la vie se finir
Pour que je retourne au Piauí